6.1.07

Não mexas mais

Com trinta e poucos anos começo a ver que só conheço os meus pais apenas como meus pais e nada mais. Desalento? Não... Gosto do que tenho, adoro o que vejo e admiro o que existe. Mas sou curiosa e gosto de remexer no passado que não conheço, no passado em que eu ainda não existia.
Da minha mãe? Até conheço muito, principalmente coisas de infância. A adolescência e juventude um pouco mais escondida, mas aos poucos vou descobrindo um pouco mais, vou descobrindo diferentes facetas. É engraçado... Olho para as fotos da minha mãe com vinte e poucos anos, em reunião com amigos, e vejo uma alegria estonteante, um sorriso lindo de morrer, uma doçura de menina... vejo tudo isso! A minha mãe a dançar... hoje diz que é “pésolas”, mas nas fotografias não é isso que transparece. Hoje continua doce, continua sorridente, mas algo está diferente... e é na alegria de viver que se nota essa diferença.
Do meu pai? Ui! “Não mexas mais” – diz ele...
O meu pai é mais antigo... sim, é essa a palavra... e por ser mais antigo, mais a sua história me entusiasma... Mas não posso mexer mais... Chateei-o durante quase dois anos, para efeitos de investigação genealógica, sobre a sua família. Sei muito dele dos tempos de África, ao ponto de sentir que lá vivi, mas os tempos anteriores são um buraco escuro e fundo. A infância? “Não mexas mais...” e deixei de mexer, porque sempre que lá tocava, o meu pai ficava triste, triste, triste... Não mexo mais, prometo... Mas doeu assim tanto? E ao fim de oitenta anos continua a doer ao ponto de não se poder falar? “Os meus pais sempre me disseram que falar de passado é conversa de adultos e por isso pouco lhes pude perguntar, por isso pouco sei...” – diz ele. E assim perco a história das gentes e costumes da minha família... tudo porque há quase oitenta anos atrás também alguém lhe disse “Não mexas mais...”

1 comentário:

Anónimo disse...

Como eu te entendo...